Desde tenra infância goza Lourenço Marques da boa fama de cidade limpa. Boa e justa fama era essa, pois Lourenço Marques tinha, de facto, requintes de asseio, na sua parte mais visível e mais conhecida lá fora – a de cimento e asfalto.
Agora não. Há uns tempos a esta
parte, vem a burguesa criatura a descuidar-se tanto de sua figura física, com tal desleixo na higiene, que parece
outra. E já se mostram bem antigos os tempos em que o visitante chegava e dizia, na fatal
entrevista: «Cidade bonita, cidade arrumadinha, cidade limpa». A gente sorria, enternecida,
porque era verdade.
Nos dias que passam, ninguém pode referir-se com
sinceridade o essa perdido faceta da risonha capital de Moçambique, onde, a
meio das manhãs de sol, nada mais juncava o pavimento das ruas e dos passeios
que não fossem as flores das acácias e dos jacarandás, dando aos repórteres o
pretexto para a velha imagem das «ruas atapetadas, etc.».
Juncam hoje as ruas lixos diversos, esquecidos pelos
carros de limpeza, desprezados pelos varredores. Tristes ficam os lixos todo o
dia e vários dias, nas valetas, junto das árvores, às vezes acumulados em
montículos com uma certa disciplina; muitas outras, caídos na mais vil
anarquia, correndo loucamente por onde calha.
Oh, sim, Lourenço Marques já foi uma cidade limpa! Agora
não. E, mesmo com o risco de levarem à conta de reaccionário saudosismo esta
minha pretensão, atrevo-me a sugerir que o serviço municipal de limpeza
abandone essas práticas modernas, talvez orientadas pelo nobre sentido de criar
rápidamente na nossa berro amada cidade um certo «cachet» de velha cidade
porca, ao estilo das mais célebres velhas cidades porcas dos mais velhos continentes,
e que se retome a antiga fórmula de varrer muito bem varrido a capital,
removendo escrupulosamente o lixo para a lixeira.
A limpeza não dá a felicidade mas ajuda muito.
Texto de
Gouvêa Lemos
Fotos de
José Amador
Voz de Moçambique – 4/4/1964
Nenhum comentário:
Postar um comentário