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quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

BOAS FESTAS!


Gouvêa Lemos -  Coluna Mesa Redonda

Este período que antecede o Natal, pela tradição e pelo significado, é um período alegre, risonho e de ternura universal.
Posto isto, vejamos se não é, também, uma grande estopada!
Os cartões de boas-festas vêm logo à cabeça. É uma prática de fina cortesia e de inegável cordialidade, essa troca de cartõezinhos ou de vastos impressos a cores, com votos de felizes festas e um próspero Ano Novo. É um laço que se ata em Dezembro, entre os corações das mais diversas gentes. Mas é uma bomba, pá!
Por exemplo: desta vez, eu tencionava manter-me anónimo e alheio a esse campo de actividades. Mas já não posso fazer tal, sem graves danos para esta reputação que prezo e me esforço por manter de criatura remediadamente educada.
Tenho, pelo menos, de agradecer e de retribuir uns poucos de votos, que me buscaram venenosamente e me encontraram, por fim. E segue-se a tragédia. Escrever cartões, arranjar envelopes de tamanho e formato funcionais, colar estampilhas, pôr no correio. E no meio dos afazeres inadiáveis e escravizantes de um sujeito atrapalhadiço, como sou, surge, a espaços, a sombra negra de um lembrete, os cartões. Ah, os cartões, tenho de fazer os cartões.
Depois vêm os presentes. Aqueles presentes bonitos, embrulhados em papel com árvores, caras de Pai Natal e fitas vermelhinhas. Não dou presentes a ninguém acabou-se. Mas olha que Fulano, Beltrano e Cicraninho já deram uns brinquedos aos garotos… surge sempre a maligna insinuação. E aí está outro problema agudo, a cotucar-nos o espírito. Compras, dinheiro e embrulhos, numerosos embrulhos - uma avalanche de embrulhos, um pesadelo.
Por fim, há que acertar com todos os casais amigos o que vamos fazer no Natal. Vocês vêm a nossa casa. Não. Vocês é que vêm à nossa. Mas que ideia! Pois isto já ficou assente desde o ano passado! Geralmente, a estratégia é jantar nas duas casas. Em uma delas, na véspera e na outra, no dia propriamente dito.
E a passagem do ano? Onde vamos passar o ano? É atroz esta dúvida. Estava combinado irmos com XX. Mas eu já disse aos YY, que sim… E ameaça-nos a sombra dos melindres. De bom conselho é, em tais casos, sermos acometidos por um ataque de fígado, no dia 31, à noite, procedendo-se à substituição do calendário, na parede da cozinha tomando uns sais de frutos. Que ninguém veja nisto um sinal de menos respeito pela maravilhosa época, vivida por toda a Humanidade, em Dezembro. Ah, não. Que ninguém escreva para o Debate!
Mas que também é uma grande estopada isso é. Sobretudo, porque não temos férias, durante o mês inteiro, para bem tratarmos de todos os pormenores e de todas as regras de uma vida social correcta e amistosa.
Entretanto, meus amigos, Boas Festas.

(Notícias da Tarde, Lourenço Marques, ano VI, nº. 1700, 20 de Dezembro de 1957, p. 1)

4 comentários:

  1. Como me foi familiar...ri-me a bom rir.
    Beijos e saudade

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  2. rsssss nada a dizer spenas sentir depois de rir , mas a não ser que apenas diga, ele estava certo...

    Ó pai !!! :-)

    Beijinho ,como é bom através de ti reviver por vezes o esquecido por mim Tareca

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  3. Agora, casado e com o nosso Artur recentemente nascido, mais do que nunca percebo muito bem neste texto do meu Tio Antonio que ele já sabia muito da vida quando ainda eu não tinha vida ... nascido!!

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  4. Acho que herdei dele, essa sensação de que estas festas existem mais para stressar, na tentativa de evitar melindres aqui e acolá, do que para festejar.
    Mas cá entre nós, gostaria mesmo era de as passar de calções junto da minha família. Mas este ano terei que passar mais uma vez, dentro do cartão postal, com neve de verdade, dos alpes.

    Tó Maria

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