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segunda-feira, 7 de junho de 2010

PARA UM RETRATO DA MINHA AMIGA CIDADE (última parte)

O compadre Tomás apanhou-o na queda e meteu-lhe um ombro sob o sovaco, puxou-lhe o braço à roda do pescoço e levou-o, de pernas bambas, pés a arrastar, os dois aos bordos, numa solidariedade forçada. O compadre Tomás, enfermeiro do Quadro de Saúde, ia a pensar na vida do João e perguntava-se a si mesmo, se fazia bem ou mal em levá-lo a casa. Ao mesmo tempo ia reparando em que a viagem, assim, era nervosa e cansativa. Quando chegaria ele, Tomás, à sua casa? E pensava, Tomás, que entraria de serviço na manhã seguinte, bem cedo. João resfolgava. Que idéia a tua João!

*

Por mim, minha amiga cidade, vou apagar a luz na mesa de cabeceira. Cansado e tentado a não ter esperança. Mas sei que acordarei com um sol doirado e quente, em céu escandalosamente azul, a envolver-te completa, nos arrebiques e maselas, no riso e no choro, na música e nos gritos, nas flores e nos charcos, nos prédios e nos barracos, no amor e na briga de todos os contrastes, dando-se na mesma dádiva às trezentas e cinqüenta mil pessoas de que és feita. E o sol, minha amiga, minha mais bela cidade do mundo, o sol nasce agora às seis e trinta e seis. Nasce fatalmente!

FIM

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4 comentários:

  1. Obrigado pela partilha Ze.
    Abraço
    Rui Romeu

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  2. Olá... Para a foto na praia (usando tuas palavras)


    Tarde de julho –
    Um sol dourado e quente
    envolve os coqueiros

    Um abraço.

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  3. Gostei muito de ler esta Crónica de Gouvêa Lemos.

    O ritmo dos sons, o barulho da época em Lourenço Marques entre a realidade crua e certa existente, surge na luz do candeeiro da mesa-de-cabeceira, no aconchego do descanso e na esperança da mudança, entre a tamanha beleza da madrugada que se aproxima.

    Inez

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